Casa das Hortas.

“O vinho e sangue da terra”, diz uma estrofe do hino da Irmandade dos Vinhos Galegos, da que é Roi Xordo e segue a ser referente principal Manuel Maria, aliás de não proceder de terra de vinhos, pois a Terra Chá, que descrevia o poeta como “un povo aqui, outro acolá,… o resto é soeda”, rica em produtos da terra, cereais e horta, erva para sua avondosa gandearia, viçosas fragas e bosques de ribeira, riqueza hoje em dia muito questionada, ficava órfã de vinhedos, que tampouco precisava porque o vinho chegava a Lugo avondosamente desde a Ribeira Sacra ou desde o Ribeiro… essa Terra Chá que viu nascer ao poeta e que o viu correr em jogos infantis, medrar e ama-la profundamente ate chegar a chora-la “por unha terra que era minha/ na que eu sentin nacer os meus amores…!/ era unha terra boa fermosa, humildosiña/ que a trocaron us homes con tractores!”.

Mas o certo é que os poetas assim como correntemente falam e fabulam sobre sua casa de infância (aqui temos a Manuel que a lembra em case todos seus livros e tematicamente no seu poemário “Sonetos á Casa de Hortas”, do que falarei algum dia, também entre nos Xulio L.Valcarcel com sua “Casa última” e muitos outros), do mesmo jeito frequentemente poetizam (ou poemizam?) o vinho. Manuel inda que não era de terra de vinho recalou no Monforte da Ribeira Sacra luguesa e cantou ao vinho, não só no hino da Irmandade, também na sua “proclama contra a guerra atómica” quando lembra a beleza das verbas: amor, trigo, compreensão, VINHO, azeite, carvalho e laranjeira, ou a prestância dos vinhos do Ribeiro e canta amplamente a todos os vinhos galegos: “Ouh viños antergos de Amandi e de Quiroga!/ com prestixio de hexâmetros latinos/ Viños de Valdeorras que en vos tendes/ o vello ouro do Sil; sono e lenda…!/ Finos caldos do Rosal, tan requintados/ como a alma de un fado melancólico!/ Viño espadeiro antergo florecido…/ Viños galegos lixeiros de beber/ fuxidios e fleves como soños!”, e mencionando o vinho espadeiro inevitavel lembrar o verso do poeta da raza, dom Ramón Cabanillas, “Ouh espadeiro amante!. Ouh rexo e quente/ sangue do corazon da nossa terra! / encende o corazon dos apoucados! / Prende lume nas almas, viño celta!!”. Manuel Maria não só convertia o vinho em poesia que também disfrutava dele, da sua cor, do seu arrecendo e aroma, do seu passe em boca, do retrogusto … e suas opiniões nas catas comentadas da Irmandade, com seu falar pousado e exposição imaginativa de sua valoração, eram escuitados com interesse polos mais de 60 ou 70 irmandinhos que por termino medio assistimos a cada capítulo.

Muito temos falado de vinhos e muito nos ficou por falar. Gostaria que fosse certo um boato de brincadeira que em tempo passado corria pola Irmandade, por mim mesmo provocado, segundo o que em ocasiões eu levitava para poder manter reuniões a media altura com Manuel Maria e Pepe Posada (inesquecível criador da irmandade), emigrantes involuntários no alem e dos que recebia opiniões, encargos, conselhos e propostas de futuras atuações da confraria que eu, já em terra firme, punha em comum com o resto dos membros do Sanedrim. Naturalmente, e para descorrentar qualquer suspeita de veracidade, asseguro que não era certo. De ser certo poderia em tempo atual comentar e escutar suas opiniões sobre esse método de elaboração do vinho no espaço exterior, do que ainda não conhecemos resultado; ou por alagamento no mar. E aproveitar a levitação para informá-los de tantas mais inovações, designadamente a do adegueiro do Ribeiro António Míguez Amil e sua adega “Boas Vides”, que seguindo escritos do século XII enterra em cofres de madeira a metro e medio baixo terra 400 garrafas que, numa cata privada, puseram em pé ao Sanedrim, rematando com um tostado “Para do Pé”, também seu, que mesmo coroava.

Sim amável leitor, já sei que o título não encaixa com o texto e o mantenho porque na realidade o que eu pretendo é animar á gente para que visite a Casa das Hortas, Casa Museu de Manuel Maria, em Outeiro de Rei, que ficará gratamente surpreendido, porque visitará uma casa tradicinal de labregos acomodados que guarda e comparte o legado de Manuel Maria, seus mais de 12.000 volumes, correspondencia com as mais importantes figuras intelectuais galegas, aberta ao público acolhe visitas escolares gratuitas, visitas de grupos de adultos, visitas de familias sábados e domingos, realiza atividades culturais no auditorio, antiga “palheira”, e durante todo o ano tanto na Casa como nos arredores e noutras cidades.

.

Advogado. Ourense - Vigo - Porto